sábado, 8 de junho de 2013

A BÍBLIA EM PORTUGUÊS




A BÍBLIA EM PORTUGUÊS


DOM DINIZ
“Venturoso, ou “bem-aventurado”. A despeito de este titulo ter sido atribuído a D. Manuel como principal incentivador das grandes navegações, mais bem-aventurado que este rei português foi um de seus antecessores, D. Diniz (1279-1325), por ter sido a primeira pessoa a traduzir para a língua portuguesa o texto bíblico, tornando assim possível a futura grande navegação dos leitores de língua portuguesa pelo imenso mar da Palavra de Deus.

Grande conhecedor do latim clássico, e leitor da versão da Bíblia, a Vulgata Latina, D. Diniz resolveu enriquecer o português traduzindo as Sagradas Escrituras para o nosso idioma, tomando como base a Vulgata Latina. Embora lhe faltasse perseverança e por isso só tenha conseguido traduzir os vinte primeiros capítulos do livro de Gênesis, esse seu esforço o colocou numa posição historicamente anterior a alguns dos primeiros tradutores da Bíblia para outros idiomas, como João Wycliff, por exemplo, que só em 1380 traduziu as Escrituras para o inglês.

Fernão Lopes, disse em seu curioso estilo de cronista do século XV, que D. João I (1385-1433), um dos sucessores de D. Diniz no trono português, “fez grandes letrados tirar em linguagem os Evangelhos, os Atos dos Apóstolos e as Epístolas de Paulo, para que aqueles que os ouvissem fossem mais devotos acerca da lei de Deus” (Crônica de D. João I, 2ª parte). Esses “grandes letrados” eram vários padres que também se utilizaram da Vulgata Latina em seu trabalho de tradução.

Enquanto esses padres trabalhavam, D. João I, também conhecedor do latim, traduziu o livro de Salmos, que foi reunido aos livros do Novo Testamento, traduzidos pelos padres. Seu sucessor, D. João II, outro grande apoiador das traduções do texto bíblico, mandou gravar no seu cetro a parte final do versículo 31 de Romanos 8: “Se Deus é por nós, quem será contra nós?”, atestando assim o quanto os soberanos portugueses reverenciavam a Bíblia.
Como nessa época a imprensa ainda não havia sido inventada, os livros eram produzidos em forma manuscrita, fazendo-se uso de folhas de pergaminho. Isso tornava sua circulação extremamente reduzida. Por ser um trabalho lento e caro era necessário que ou a Igreja Romana ou alguém muito rico assumisse os custos do projeto. Ninguém mais indicado que os nobres e os reis.

Outras figuras da monarquia de Portugal também realizaram traduções parciais da Bíblia. A neta do rei D. João I e filha do Infante D. Pedro, a Infanta D. Filipa, traduziu do francês os Evangelhos. No século XV surgiram publicados em Lisboa oEvangelho de Mateus e porções dos demais Evangelhos, um trabalho realizado pelo frei Bernardo de Alcobaça, que pertenceu a grande escola de tradutores portugueses da Real Abadia de Alcobaça. Ele baseou suas traduções na Vulgata Latina.

Primeira Harmonia dos Evangelhos em língua portuguesa, preparada em 1495 pelo cronista Valentim Fernandes, e intitulada da Vita Christi, teve os seus custos de publicação pagos pela rainha Dona Leonora, esposa de D. João II. Cinco anos após o descobrimento do Brasil, D. Leonora, mandou também imprimir o livro de Atos dos Apóstolos e as epístolas universais de Tiago, Pedro, João e Judas, que haviam sido traduzidos do latim vários anos antes por frei Bernardo de Brinega.

Em 1556 foi publicado em Lisboa uma gramática hebraica para estudantes portugueses. Ela trazia em português como texto básico o livro de Obadias.

A TRADUÇÃO DE JOÃO FERREIRA DE ALMEIDA
Coube a João Ferreira de Almeida a grandiosa tarefa de traduzir pela primeira vez para o português o Antigo e o Novo Testamento. Nascido em 1628, em Torre de Tavares, nas proximidades de Lisboa, João, quando tinha 12 anos de idade, mudou-se para o sudoeste da Ásia. Após viver dois anos na Batávia (atual Jacarta), na ilha de Java, Indonésia, Almeida partiu para Málaca, na Malásia, e pela leitura de um folheto em espanhol acerca das diferenças da cristandade converteu-se do catolicismo a fé evangélica. No ano seguinte começou a pregar o evangelho no Ceilão (hoje Sri Lanka) e em muitos pontos da costa Malabar.

João não tinha 17 anos de idade quando iniciou o trabalho de tradução da Bíblia para o português, mas lamentavelmente perdeu seu manuscrito e teve de reiniciar a tradução em 1648.

Por conhecer o hebraico e o grego, Almeida pôde utilizar-se de manuscritos dessas línguas. Utilizou em sua tradução o Textus Receptus, do grupo bizantino. Durante esse exaustivo e criterioso trabalho, ele também se serviu das traduções holandesas, francesas, italiana espanhola e da Vulgata Latina.

Em 1676, Almeida concluiu a tradução do Novo Testamento, e naquele mesmo ano remeteu o manuscrito para ser impresso na Batávia, mas o lento trabalho de revisão a que a tradução foi submetia levou João a retomá-la e enviá-la para ser impressa em Amsterdã, na Holanda. Finalmente em 1681 surgiu o primeiro Novo Testamento em Português, trazendo na primeira página os seguintes dizeres:

“O Novo Testamento, isto é, Todos o Sacro Santos Livros e Escritos Evangélicos e Apostólicos do Novo Concerto de Nosso Fiel Salvador e Redentor Jesus Cristo, agora traduzido em português João Ferreira de Almeida, ministro pregador do Santo Evangelho. Com todas as licenças necessárias. Em Amsterdã, por viúva de J. V. Someren. Ano 1681”.

Milhares de erros foram detectados nesse Novo Testamento de Almeida, muitos deles produzidos pela comissão de eruditos que tentou harmonizar o texto em português com a tradução com a tradução holandesa de 1637. O próprio Almeida identificou mais de dois mil erros nessa tradução, e outro revisor, Ribeiros dos Santos, afirmou ter encontrado um número bem maior que dois mil erros.

Logo após a publicação do Novo Testamento, Almeida iniciou a tradução do Antigo Testamento, e ao falecer em 6 de agosto de 1691, havia traduzido até Ezequiel 41.21. Em 1748, o pastor Jacobus op den Akker, da Batávia, reiniciou o trabalho interrompido por Almeida, e cinco anos depois, em 1753 foi impressa a primeira Bíblia completa em português, em dois volumes. Estava, portanto, concluído o inestimável trabalho de tradução da Bíblia por João Ferreira de Almeida.

Apesar dos erros iniciais, ao longo dos anos estudiosos evangélicos têm depurado a obra de João Ferreira de Almeida, tornando-a a preferida dos leitores de língua portuguesa.

A TRADUÇÃO DE FIGUEIREDO
Nascido em 1725, em Tomar, nas proximidades de Lisboa, o padre Antonio Pereira de Figueiredo, partindo da Vulgata Latina, traduziu integralmente o Novo e o Antigo Testamento, gastando dezoito anos nessa laboriosa tarefa. A primeira edição do Novo Testamento saiu em 1778, em seis volumes. Quanto ao Antigo Testamento, os dezesseis volumes de sua primeira edição foram publicados de 1783 a 1790. Em 1819 veio a luz a Bíblia completa de Figueiredo, em sete volumes, e em 1821 ela foi publicada pela primeira vez em um volume único.

Figueiredo inclui em sua tradução os chamados livros apócrifos que o Concílio de Trento havia acrescentado aos livros canônicos em 8 de abril de 1546. Esse fato tem contribuído para que a sua Bíblia seja ainda hoje apreciada pelos católicos romanos nos países de fala portuguesa.

Na condição de exímio filólogo e latinista, Figueiredo pôde utilizar-se de um estilo sublime e grandiloqüente, e seu trabalho resultou em um verdadeiro monumento da prosa portuguesa. Porém, por não conhecer as línguas originais e ter-se baseado tão-somente na Vulgata Latina, sua tradução não tem suplantado a preferência popular pelo texto de Almeida.

OUTRAS TRADUÇÕES
Outras traduções em língua portuguesa, realizadas em Portugal, são dignas de menção:

- Os quatro Evangelhos, traduzidos em elegante português pelo padre jesuíta Luiz Brandão.

- No inicio do século XIX, o padre Antonio Ribeiro dos Santos, traduziu os Evangelhos de Mateus e Marcos.

É fundamental salientar que todas essas obras, exceção feita a tradução de Figueiredo, sofreram ao longo dos séculos, implacável perseguição da Igreja Romana, e de muitas delas só escaparem um ou dois exemplares, hoje raríssimos. A Igreja Romana também amaldiçoou a todos os que conservassem consigo essas “traduções da Bíblia em idioma vulgar”, conforme as denominavam.

Nenhum comentário: