segunda-feira, 10 de agosto de 2020

 A região africana — que foi dominada como colônia da Bélgica — ficou conhecida como uma das experiências mais violentas de dominação contemporânea

ANDRÉ NOGUEIRA PUBLICADO EM 13/06/2020, ÀS 08H00

Congo Belga
Congo Belga - Wikimedia Commons

O Congo é um dos maiores e mais relevantes países da África, tendo um passado sombrio de crimes e atrocidades cometidos pela dominação colonial. Domínio dos belgas desde a Conferência de Berlim, a região, que posteriormente se tornaria um país, chocou o mundo diante de denúncias de abusos e ações criminosas por parte dos ocupadores. 

O país até hoje sofre consequências do caos político criado pela colonização e pelos atritos desenvolvidos pela política de morte da Bélgica, que não apenas colocou grupos étnicos diferentes em batalha como também embaralhou a distribuição demográfica regional. Por esse motivo, o Congo sofreu diversos episódios de golpes e guerras civis e hoje mergulha numa precariedade estrutural que impede seu desenvolvimento.

Conheça 5 fatos sobre o período mais sombrio de sua história, marcado pela dominação belga.

1. Propriedade privada

Rei Leopoldo II  / Crédito: Wikimedia Commons

 

O Congo Belga é o nome dado ao território ultramarino da Bélgica a partir de 1908, quando a região passou por mudanças de status jurídico. Isso porque, originalmente, o Congo era a maior propriedade privada do mundo, sendo dominado pelo rei belga Leopoldo II, que liderou os horrores cometidos. A essa grande propriedade, dava-se o nome de Estado Livre do Congo.

2. Exploração diária

Belgas e cativos mostrando mãos decepadas / Crédito: Wikimedia Commons

 

Entre as ações hediondas que ocorriam no Congo Belga, denunciadas pela Comunidade Internacional, a escravidão era a mais comum. Em nome da extração de recursos naturais valiosos, — como minérios e borracha — a Force Publique e o Exército criaram um regime de dominação baseado em castigos e punições, que incluíam a chibata, armas modernas, tortura, afogamento, estupro, incineração de aldeias e assassinato.

Uma das técnicas de controle que ficou conhecida por seu uso no Congo Belga era a dilaceração ou extirpação de membros como punição pelo não cumprimento da cota de trabalho. Basicamente, quando os senhores estavam insatisfeitos com a coleta dos trabalhadores, uma mão ou um pé era arrancado. Assim ocorria sucessivamente, até que homens e mulheres não fossem mais capazes de trabalhar, sendo executados ou deixados para morrerem de inanição.

3. Denúncias

George Washington Williams / Crédito: Wikimedia Commons

 

Além da disputa colonial e ética, propriamente ditas, outras potências do norte atuaram como revezes ao projeto de governo dos belgas na África. Por isso, países como EUA, Inglaterra e França se esforçaram na criação de impeditivos contra a Bélgica de Leopoldo, incluindo uma série de denúncias contra o regime congolês.

O Reino Unido, claro, tinha como compromisso principal sua hegemonia na disputa por territórios e o enfraquecimento do oponente continental. Porém, a primeira denúncia contra os crimes de Leopoldo vieram de uma boa intenção: George Washington Williams, um escritor e militar estadunidense, que anunciou ao mundo as barbáries ocorridas no país após uma viagem de investigação.

4. Independência

Patrice Lumumba / Crédito: Wikimedia Commons

 

Assim como a maioria dos países africanos, a emancipação política do Congo Belga veio acontecer depois da Segunda Guerra Mundial, após esforços diversos de negociação e guerra contra o domínio colonial. O processo de independência do país passou, principalmente, por um movimento diplomático, associado com programas de autonomia econômica e algumas revoltas mais violentas, tendo como principal condutor o Movimento Nacional Congolês, em sua ala de caráter socialista, anti-imperialista e pan-africanista.

Seu principal preceptor era Patrice Lumumba, um líder político envolvido com o movimento desde antes da independência, quando fazia representações do país. Com sua participação, o Congo declarou sua independência em 1960, quando Lumumba foi eleito primeiro-ministro e convencionou o nome República do Congo à nação. Lumumba se manteve no poder até sofrer um golpe de Mobutu Sese Seko, 12 semanas depois.

5. Genocídio

As atrocidades cometidas no Congo Belga estão entre as mais violentas do mundo contemporâneo, e as diversas denúncias feitas contra a Bélgica tentaram incluir o crime de genocídio. Porém, essa acusação foi alvo de grande polêmica. Segundo a defesa belga, nunca houve um alvo étnico nas ações do Estado, com intuito de eliminação, então a acusação não procederia.

Porém, uma resolução sobre esse tema da ONU declarou que um genocídio implica em qualquer prática deliberada de matança de membros de um grupo étnico distinto, em que a intenção inclui destruição, mesmo que parcial, da população. Portento, o que aconteceu no Congo foi genocídio

QUAIS FORAM AS ESTÁTUAS AFETADAS PELOS PROTESTOS ANTIRRACISTAS NO MUNDO?

 Derrubadas, removidas, pichadas e desfiguradas, figuras ligadas à colonização, escravidão e ao fascismo foram alvos de manifestações

ANDRÉ NOGUEIRA PUBLICADO EM 15/06/2020, ÀS 12H56

Estátua vandalizada de Leopoldo II
Estátua vandalizada de Leopoldo II - Divulgação

Durante os protestos antirracistas, antifascistas e antissistema que vêm tomando o mundo, com foco nos EUA, muitas estátuas em homenagem a nomes ligados ao escravismo e ao colonialismo estão sendo pichadas, desfiguradas, derrubadas ou removidas de seus pedestais por esforços de mudança dos paradigmas de memória.

Conheça os nomes de figuras que tiveram seus monumentos alterados nessa onda de manifestações

Símbolos de homens do passado ligados ao escravismo foram destruídos ou removidos pelos próprios governos por pressões da sociedade. Um dos casos mais famosos se encontra com a figura do navegador Cristóvão Colombo, responsável pelo início do genocídio indígena na América, cuja estátua fora decapitada em Boston e derrubada em Richmond. Estátuas suas também foram vandalizadas em Wilkes-Barre e Springfield.No Reino Unido, a homenagem ao traficante de escravos Edward Colston foi lançada num rio, mesmo destino de John McDonogh, empresário colonialista, em Nova Orleans. Já no Oregon, uma série de protestos nas universidades derrubou duas estátuas de Alexander Phimister Proctor, que fazia referência aos pioneiros europeus da colonização (The Pioneer e The Pioneer Mother).

Tiveram o mesmo destino monumentos a figuras importantes da defesa da escravidão nos EUA: Thomas Jefferson, em Portland, e Jefferson Davis, em Richmond. Já outras estátuas foram removidas pelo governo após muitas pressões e depredações contra estátuas. No Reino Unido, por exemplo, um monumento a Robert Milligan, traficante de escravos, em Londres, e uma estátua de um menino escravo carregando peso em Dunham foram retirados.

Além disso, após fortes depredações de uma estátua do rei Leopoldo II na Antuérpia (Bélgica), o símbolo foi removido, assim como uma representação do militar colonizador John Hamilton, na cidade de Hamilton, na Nova Zelândia.

Estátua de Thomas Jefferson derrubada / Crédito: Divulgação

 

Vandalizadas

Os protestos ao redor do mundo também picharam com acusações de racismo e destruíram parcialmente estátuas de figuras polêmicas de tempos mais recentes. É o caso de Winston Churchill, em Londres.Nos EUA, figuras como Robert E. Lee (Richmond), general confederado e Matthew Deady (Eugene), colonizador foram pichados. O mesmo ocorreu em Melbourne (Austrália) com a imagem do navegador e colonizador James Cook e, em Auckland (Nova Zelândia) com George Grey. Uma imagem de Indro Montanelli, em Milão, Itália, foi desfigurada em protestos antifascistas por sua ligação com o programa de colonização do chifre africano de Mussolini.

Pichações também afetaram figuras como Robert Dundas, Henry Temple (Visconde de Palmerston) e Tomas Carlyle, aristocratas britânicos, no Reino Unido, assim como placas em Londres e Berlim com nomes associados ao racismo.

Monumentos foram ameaçados de destruição, mas não chegaram a ser atingidos. É o caso de Robert Clive (militar colonial) e Robert Peel (político) em Londres, além de Gandhi e Mandela, protegidos contra eventuais ataques da extrema-direita, e o fundador do escotismo Robert Baden-Powell (militar e colonialista) em Poole, que teve interferências estéticas mas foi protegido pela população.

Estátua de Winston Churchill pichada / Crédito: Divulgação

 

Em outro protesto, em Dunedin, na Escócia, duas estátuas sofreram com pichações e cartazes: o poeta Robbie Burns, figura central do país, mas acusado de racismo e crimes de estupro, e a Rainha Vitória, responsável por ações de colonização na Ásia, na África e no próprio Reino Unido.

Pedidos de remoção

Além disso, já movimentos da sociedade civil pelo mundo que apelam ao governo para que estátuas ligadas ao escravismo sejam derrubadas, mas que ainda não sofreram ataques propriamente ditos dessas manifestações.

Na cidade de São Paulo, Brasil, abaixo-assinados pedem a derrubada do Monumento às Bandeiras, que homenageia o movimento de adentramento à colônia por caçadores de índios, e a estátua de Manoel Borba Gato, famoso pela prisão de indígenas e africanos para o mercado de escravos.

O Monumento às Bandeiras já foi pintado em protesto anos atrás / Crédito: Fotos Públicas

 

Além disso, em Boston, existe uma petição pela derrubada de uma estatua de Abraham Lincoln com um escravo aos pés; uma do ex-presidente William Henry Harrison em Cincinnati; e no Texas, pela retirada de Lawrance Sullivan Ross, político ligado ao escravismo.

Em Oxford, há pedidos contra um monumento ao empresário Cecil Rhodes, central na colonização da África, e em Montreal (Canadá), contra o proprietário de escravos James McGill.

QUAL ERA A RELAÇÃO DA FAMÍLIA REAL COM A ESCRAVIDÃO?

 Após um ano da abolição, a monarquia caiu no Brasil. Entenda a relação entre os governantes e a escravidão durante os 67 anos de governo

JÂNIO DE OLIVEIRA FREIME PUBLICADO EM 28/05/2019, ÀS 18H00

Família Real no governo Pedro II
Família Real no governo Pedro II - Wikimedia Commons

Uma das principais características da monarquia brasileira, única na América do Sul, foi o mantimento do sistema escravista enquanto a tendência americana e mundial era a emancipação e o apelo à mão-de-obra assalariada.

Entretanto, o governo dos Orléans e Bragança no Brasil penou para articular uma forma de abolição e modernização econômica, estando muito mais acomodado na estrutura escravista que governava.

Ao mesmo tempo, é comum na memória brasileira associar Pedro II e a princesa Isabel a um liberalismo antiescravista, que de repente expõe uma contradição.

Inicialmente, é importante remeter que o governo imperial brasileiro tinha como cabeça principal um membro da Casa de Bragança, dinastia de reis que governavam Portugal desde 1640 e cujo herdeiro se fixou em terras tropicais.

Além disso, ao monarca brasileiro fora prometido um trono vazio desde os 5 anos de idade, quando seu pai deixou o Brasil para governar Portugal. Nesse sentido, Dom Pedro II foi bem instruído a ser um bom articulador político e um entendedor do mundo da política.

Pedro II e Isabel / Crédito: Wikimedia commons

 

A grande marca dos Bragança é a sua assinatura colonial.Governantes da colônia brasileira, desde a independência da Espanha, tinha como tradição o governo de uma sociedade servil marcada pela escravidão.

No século XIX, com o Brasil já independente, criou-se a narrativa (mérito principalmente do historiador Varnhagen) de que a monarquia brasileira tinha a missão espiritual de prosseguir os trabalhos de Portugal de civilização das terras americanas e a criação de um reino católico unificado.

O projeto civilizador brasileiro, extremamente hierarquizado e escravista, somado à formação do Estado-Nação no Brasil centrado numa máscara parlamentarista da monarquia (cuja possibilidade de intervenção do rei e o Poder Moderador impedem a classificação de um verdadeiro parlamentarismo democrático), criou um cenário onde o Brasil é um país liberal governando uma sociedade servil.


Ao mesmo tempo em que em todo o governo imperial, antes de uma pauta humanitária (pois só será assim na segunda metade do século XX), a escravidão era uma pauta de governo estritamente ligada à economia.

A maioria massiva da produção nacional utilizava a mão-de-obra escrava no início do século XIX, ao mesmo tempo em que, durante o Império, foi contrabandeado mais escravos africanos do que durante todo o período colonial acumulado.

E, nesse ponto, o governo de Pedro I se esforçou para manter, em termos constitucionais e institucionais, a escravidão como uma lacuna jurídica. Não há legislação sobre a escravidão, ela só é permitida por ausência de proibição. Parte disso está no constrangimento que seria ter estatutos legais da escravidão em pleno nascimento do capitalismo industrial internacional.

Desembarque de escravos no Brasil: Período Imperial se destaca / Crédito: Reprodução

 

Já com Pedro II, o pragmatismo político orientou a relação do governo com a questão servil. Antes das supostas noções do monarca em relação à humanidade dos escravizados, o monarca sabia que a base de seu poder eram as elites escravistas da monocultura do café, principalmente o eixo do Vale do Paraíba, e os ricos traficantes de escravos do Atlântico.

E como boa parte das transações econômicas no Império envolvia o tráfico, mesmo que ele fosse proibido, o governo colocou em prática uma articulação inteligente: quanto mais alforrias eram concedidas, mais escravos eram adquiridos.

Havia, no século XIX, praticamente uma indústria das alforrias para manter o tráfico em circulação. Enquanto isso, a proibição do tráfico pelos acordos internacionais e as leis de 1831 e 1850 eram burlados pela negligência intencional do Estado.

Um dos principais empecilhos da ordem escravista, além das grandes revoltas no interior do país, era a pressão internacional comandada pela Inglaterra a favor da mudança econômica em direção ao capitalismo assalariado.

Pedro II, em sua articulada diplomacia, propagava a imagem do Brasil como Estado Ocidental liberal enquanto encobria a realidade escravocrata no campo brasileiro. A figura montada de Pedro II como soberano moderno e liberal tinha um importante papel diplomático para um país como o Brasil que funcionava praticamente como um Estado-pirata: contra todas as alianças internacionais, manteve o sustento do tráfico proibido e a entrada de escravos no país.

Mineradores escravizados em MG, 1880 / Crédito: IMS

 

O abolicionismo, por outro lado, teve origens no medo que a elite sentia de uma revolta generalizada de negros que trabalhavam no campo, em favor de sua libertação, medidas reparatórias e distribuição de lotes de terra. Ao mesmo tempo em que percebia uma tendência nacional que abandonava o uso de escravos e migravam gradativamente para o trabalho assalariado.

O haitianismo e a possibilidade de estourar uma reforma agrária exigiram mudanças urgentes para manter o poderio econômico das elites cafeicultoras.

Por esse motivo que, a partir da década de 1870, o abolicionismo em diversas formas legais (Lei do Ventre Livre, Sexagenário, Eusébio de Queirós e outras medidas que adiaram a abolição) se tornou uma bandeira essencial dos conservadores do Partido Saquarema, depois apropriada pelo governo, também conservador, na mão da Princesa Isabel, que assinou uma lei de importante cunho econômico pela readaptação do Brasil nos critérios internacionais.

DEPRESSÃO, INSALUBRIDADE E MEDO: 5 FATOS SOBRE OS HORRORES DOS NAVIOS NEGREIROS

 O tráfico de escravizados foi um dos mais atrozes e duradouros movimentos de subjugamento de povos da história da humanidade

ANDRÉ NOGUEIRA PUBLICADO EM 28/06/2020, ÀS 09H00

Gravura de tortura a escravo
Gravura de tortura a escravo - Getty Images

Os navios negreiros eram embarcações que marcaram uma mancha atroz na História da Idade Moderna, causando tortura e  humilhação milhões de pessoas sequestradas de seu continente em nome do lucro pessoal e da construção principalmente de colônias à base do trabalho compulsório. Objeto central da transformação da escravidão numa indústria comandada pela Europa mudou para sempre as relações entre os povos ao redor do mundo.

Conheça alguns fatos assustadores sobre esses barcos daProlegômenos estatísticos

Tráfico Negreiro / Crédito: Getty Images

 

Segundo o The Trans-Atlantic Slave Trade Database, iniciativa de banco de dados catalográfico sobre o tráfico atlântico na modernidade, o Reino Unido,Portugal e Brasil foram agentes centrais no comércio do tráfico negreiro. Ao contrário dos EUA, onde os escravos eram assistidos à reprodução para um fornecimento sustentável de mão de obra, a renovação de populações pelo tráfico no Brasil era central, economicamente.

Os dados, obtidos a partir de anotações de entrada e saída de escravos, indicam que cerca de 20 milhões de explorados foram retirados da África, sendo que 10% morreram nos navios. Dos 90 portos africanos operantes para os luso-brasileiros, 9,2 mil viagens à colônia foram feitas (de 11, totais nos três séculos mais centrais).

https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/depressao-insalubridade-e-medo-5-fatos-sobre-os-horrores-dos-navios-negreiros.phtml2. Protegidos por seguradoras

Navio no século 19 / Crédito: Wikimedia Commons

 

A maioria dessas embarcações era protegida por apólices e financiamentos de seguradoras europeias que favoreciam esse negócio arriscado. Tratando-se de uma mercadoria que, na verdade, é uma vida (suscetível à morte) e considerada de grande valor, esses seguros também foram a origem de grandes tragédias.

Isso porque em algumas situações a vigem enfrentou obstáculos dispendiosos. Era mais lucrativo para o traficante, mesmo diante de um item valioso, a morte dos escravos, com o ressarcimento do seguro de vida, do que completar a viagem.

Isso levou muitos capitães a assassinarem escravos em nome do lucro. Um dos casos mais famosos ocorreu em 1781, no navio do capitão britânico Luke Collingwood, que matou um terço da "carga".

3. Operavam ilegalmente com apoio do governo brasileiro

Porões do navio / Crédito: Wikimedia Commons

 

No século 19, as pressões do capitalismo e moralidade protestante levaram a Inglaterra a iniciar uma campanha contra o tráfico negreiro, obrigando a maioria dos países mais fracos a aderirem a essa lógica. O Bill Aberdeen, em 1845, e a Lei Eusébio de Queiroz, em 1850, aboliram oficialmente o tráfico no Brasil, todavia, o comércio continuou ganhando força. 

Os navios brasileiros aportavam clandestinamente no Brasil, sem maiores dificuldades, sendo teoricamente monitorados e "punidos" pela Marinha. A complacência do país para com a atividade internacionalmente ilegal fez com que muitos historiadores considerassem o Império como um Estado-pirata, que colaborava para que os barcos desviassem da fiscalização britânica. Como os navios estadunidenses não permitiam vistorias, vários navios carregavam uma bandeira dos EUA.

4. Vida miserável

Modelo em maquete de um exemplar / Crédito: Wikimedia Commons

 

Os navios negreiros tinham três patamares nos porções, com cerca de meio a um metro de altura, onde a maioria dos escravos era aprisionada (apenas as crianças podiam circular nos convés). Eles eram presos pelos pés ao lado de mais de 500 pessoas. Quando poderiam ir ao lado de fora para realizar exercícios e tomar sol, eles eram obrigados a dançar e cantar para a diversão da tripulação, dando origem a uma cena de melancolia e dor disfarçada.

A depressão (conhecida como banzo) e a raiva predominavam entre os subjugados. Isso fez com que muitos escravizados organizassem revoltas e motins contra o capitão, tentando tomar o navio. A mais famosa delas ocorreu no navio anglófilo Amistad, em 1839, mas existem inúmeros casos. Em alguns deles, quando derrotados, ordenava-se a execução de todos, cujos corpos eram lançados no mar.

5. Ultima sobrevivente

Matilda / Crédito: Divulgação

 

Em 2020, foi identificada pela historiadora Hannah Durkin, da Universidade de Newcastle aquela que é considerada a última sobrevivente do tráfico negreiro conhecida, pelo menos nos EUA, trata-se da beninense Matilda McCrear. Sequestrada aos dois anos de idade e levada ao Alabama no navio Clotilda em 1860, ela viveu até os anos 1940.

Trabalhando ainda criança numa fazenda até a abolição de fato no país, em 1865, ela continuou na zona rural boa parte da vida. Descrevendo a experiência nos navios e na lástima escravista para os netos, ela influenciou os descendentes a lutarem por respeito, sendo que eles integraram as linhas de frente dos Movimentos pelos Direitos Civis.