Karl Marx
Concepção de religião, segundo Karl Marx
Discutir-se-á os pressupostos metodológicos e epistemológicos da
sociologia da religião em aportes teóricos subjacentes na sociologia de Marx,
enfocando as abordagens relativas à questão da ordem social e suas mudanças.
A maneira marxiana de analisar a realidade social é fundada numa
perspectiva ontológica, o que a diferencia substancialmente de Durkheim e
Weber. A perspectiva ontológica marxiana difere, em suas linhas básicas e essenciais,
das perspectivas gnosiológicas de análise da realidade social. A perspectiva
ontológica busca entender, como o em si pode ser capturável em sua integridade.
Na perspectiva de Marx, qualquer componente da ação ou da identidade dos
indivíduos que não resulte ou não se vincule diretamente a sua inserção
“objetiva” no processo produtivo tem um status meramente residual. A devoção
religiosa, na medida em que não é um componente essencial das identidades
individuais, não foge a essa regra. Tudo que se tem a dizer sobre ela é que é
inconsistente com a identidade essencial dos indivíduos, são cognições
disfuncionais com o que indivíduos históricos concretos virão a ser. Portanto,
a religião não é propriamente objeto de seu estudo, mas de condenação.
Para Marx: “tudo o que existe, tudo o que vive sobre a Terra e sob a
água, não existe e não vive, senão em virtude de um movimento qualquer. Assim,
o movimento da história cria as relações sociais, o movimento da indústria nos
proporciona os produtos industriais etc.”(Miséria da Filosofia).
Ao criticar o método do “Sr. Proudhon”, Marx diz que aquilo que Hegel
fez para a religião, o direito etc., o “Sr. Proudhon” “pretende fazer para a
economia política.” Ou seja, Marx critica não a dialética, mas a maneira proudhoniana,
idealista, de tratar a dialética. Ao contrário de eternizar as idéias, as
categorias, Marx as entende como sendo “produtos históricos e transitórios”.
Para o “Sr. Proudhon”,
“cada categoria econômica tem dois lados, um bom e outro mal. Considera as categorias como o pequeno-burguês considera as grandes figuras históricas: Napoleão é um grande homem; fez muito bem, mas também fez muito mal.O lado bom e o lado mal, a vantagem e o incoveniente, tomado em conjunto, formam, segundo Proudhon, a contradição inerente a cada categoria econômica. Problema a resolver: conservar o lado bom, eliminando o mal”. (Idem).
“cada categoria econômica tem dois lados, um bom e outro mal. Considera as categorias como o pequeno-burguês considera as grandes figuras históricas: Napoleão é um grande homem; fez muito bem, mas também fez muito mal.O lado bom e o lado mal, a vantagem e o incoveniente, tomado em conjunto, formam, segundo Proudhon, a contradição inerente a cada categoria econômica. Problema a resolver: conservar o lado bom, eliminando o mal”. (Idem).
No exercício de explicitação do método gnosiológico do “Sr. Proudhon” em
a Miséria da Filosofia, Marx traça as linhas do seu próprio “método”. Neste
texto, Marx procura demonstrar ontologicamente, como o em si pode ser
capturável em sua integridade. Para ele, a fonte da ciência está no
conhecimento crítico do movimento histórico, movimento esse que produz ele
próprio as condições materiais da emancipação humana.
A dialética hegeliana era a dialética do idealismo (doutrina filosófica
que nega a realidade individual das coisas distintas do “eu” e só lhes admite a
idéia), e a dialética do materialismo é posição filosófica que considera a
matéria como a única realidade e que nega a existência da alma, de outra vida e
de Deus. Ambas sustentam que realidade e pensamento são a mesma coisa: as leis
do pensamento são as leis da realidade. A realidade é contraditória, mas a
contradição supera-se na síntese que é a “verdade” dos momentos superados.
Hegel considerava ontologicamente (do grego onto + logos parte da
metafísica, que estuda o ser em geral e suas propriedades transcendentais) a
contradição (antítese) e a superação (síntese). Marx considerava historicamente
como contradição de classes vinculada a certo tipo de organização social. Hegel
apresentava uma filosofia que procurava demonstrar a perfeição do que existia
(divinização da estrutura vigente). Marx apresentava uma filosofia
revolucionária que procurava demonstrar as contradições internas da sociedade
de classes e as exigências de superação.
Para Marx, a partir do instante em que o processo do movimento dialético
se reduz ao simples processo de opor o bem ao mal, de equacionar problemas cuja
finalidade consiste em eliminar o mal e empregar uma categoria como antídoto da
outra, as categorias perdem sua espontaneidade, a idéia “deixa de funcionar”,
já não há vida nela.
Neste sentido, o movimento da história é um processo de construção,
satisfação e reconstrução contínua, não linear, das necessidades humanas. É
isso que distingue o homem dos animais, cujas necessidades são fixas e
imutáveis. É por essa razão que o trabalho, esse intercâmbio criador entre os
homens e seu ambiente natural, está na base da sociedade humana. A relação
entre o indivíduo e o seu ambiente material estabelece-se por mediação das
características particulares da sociedade a que pertence. Quando pretendemos
estudar a evolução da sociedade humana, temos de partir do exame dos processos
concretos da vida social que constitui condition sine qua non da existência
humana.
A essência do homem é não ter essência, a essência do homem é algo que
ele próprio constrói, ou seja, a História. “A existência precede a essência”;
nenhum ser humano nasce pronto, mas o homem é, em sua essência, produto do meio
em que vive que é construído a partir de suas relações sociais em que cada
pessoa se encontra. Assim como o homem produz o seu próprio ambiente, por outro
lado, esta produção da condição de existência não é livremente escolhida, mas
sim, previamente determinada. O homem pode fazer a sua História, mas não pode
fazer nas condições por ele escolhidas. O homem é historicamente determinado
pelas condições, logo é responsável por todos os seus atos, pois ele é livre
para escolher. Logo todas as teorias de Marx estão fundamentadas naquilo que é
o homem, ou seja, o que é a sua existência. Portanto, Marx vê a racionalidade
como autocontida, e cognições que a transcendam (a religião) são meras
derivações que servem à legitimação dos interesses materiais dos atores.
Para Marx as relações sociais do homem são tidas pelas relações que o
homem mantém com a natureza, onde desenvolve suas práticas, ou seja, o homem se
constitui a partir de seu próprio trabalho, e sua sociedade se constitui a
partir de suas condições materiais de produção, que dependem de fatores
naturais (clima, biologia, geografia … ) ou seja, relação homem-natureza, assim
como da divisão social do trabalho, sua cultura.
Marx expressa no Manifesto aspectos que se vêem todos transformados:
“A burguesia rompeu com todos os laços feudais que subordinavam os homens aos seus ‘superiores naturais’, e não deixou entre homem e homem nenhum outro laço senão seus interesses nus, senão o empedernido salário. Transformou o êxtase paradisíaco do fanatismo piedoso (…) A burguesia despiu o halo de todas as ocupações até então honoráveis, encaradas com reverente respeito (…) Em lugar da exploração mascarada sob ilusões religiosas e políticas, ela colocou uma exploração aberta, desavergonhada, direta e nua.” (p. 475-76)
“A burguesia rompeu com todos os laços feudais que subordinavam os homens aos seus ‘superiores naturais’, e não deixou entre homem e homem nenhum outro laço senão seus interesses nus, senão o empedernido salário. Transformou o êxtase paradisíaco do fanatismo piedoso (…) A burguesia despiu o halo de todas as ocupações até então honoráveis, encaradas com reverente respeito (…) Em lugar da exploração mascarada sob ilusões religiosas e políticas, ela colocou uma exploração aberta, desavergonhada, direta e nua.” (p. 475-76)
A oposição aqui feita por Marx é basicamente entre o que é aberto ou nu
e o que é escondido, velado, vestido. Para ele na maior parte do pensamento
especulativo antigo e medieval, todo o universo da experiência sensual parece
como o ilusório e o verdadeiro universo é concebido como acessível somente
através da transcendência dos corpos, do espaço e do tempo. Em algumas
tradições, a realidade é acessível através da meditação religiosa ou
filosófica; em outras, só estará à nossa disposição numa existência futura,
pós-morte. (BERMANN, 1986; 104)
Para Marx, a moderna transformação, iniciada na época da Renascença e da
Reforma, coloca ambos os universos na terra, no espaço e no tempo, preenchidos
com seres humanos. Agora o falso universo é visto como o passado histórico, um
mundo que perdemos (ou estamos a ponto de perder), enquanto o universo
verdadeiro consiste no mundo físico e social que este para nós, aqui e agora
(ou está a ponto de existir).
Assim como o movimento da história não é mais do que a sucessão das
várias gerações distintas, cada uma das quais explora os materiais, os capitais
e as forças produtivas que herdou de todas as gerações precedentes, continuando
assim, por um lado, a atividade tradicional, em condições completamente
diferentes, e modificando, por outro lado, as antigas condições, por intermédio
de uma atividade completamente modificada. A sociedade é comparada a um
edifício no qual as fundações, a infraestrutura, seriam representadas pelas
forças econômicas, enquanto o edifício em si, a superestrutura, representaria
as idéias, costumes, instituições (políticas, religiosas, jurídicas etc.).
Para Marx, religião é a teoria geral deste mundo, a sua soma enciclopédia, a sua lógica sob forma popular o “son point d’honnem” espiritualista, seu entusiasmo, a sua sanção moral, o seu complemento solene, a sua consolação e justificação universal. É a realização fantástica do ser humano porque o ser humano não possui verdadeira realidade.
Para Marx, religião é a teoria geral deste mundo, a sua soma enciclopédia, a sua lógica sob forma popular o “son point d’honnem” espiritualista, seu entusiasmo, a sua sanção moral, o seu complemento solene, a sua consolação e justificação universal. É a realização fantástica do ser humano porque o ser humano não possui verdadeira realidade.
A ênfase dada à racionalidade prática pode conduzir a uma riquíssima
teoria de mudança social: desmistifica certas relações de poder e anda de par
com a busca do carisma que, por definição a ela se contrapõe. Assim como a
ênfase no aspecto cognitivo das religiões também conduz a uma teoria da mudança
social. Por outro lado, a ênfase nos aspectos emocionais, conduz a uma
riquíssima teoria de coesão social e ao ensaio genial de que as nossas
comunicações e cognições não operam sobre bases cognitivas e sim emocionais
Francisco Haas
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